sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A rigor


Sempre fui muito rigoroso comigo mesmo em relação às minhas obrigações profissionais. Tanto que nesses quase 26 anos (a serem completados no próximo 19 de dezembro) do Diário, a minha coluna só não ´foi ao ar´ em duas ocasiões. A primeira, ainda nos anos 80, porque, numa quarta-feira de cinzas, a direção decidiu que o Caderno 3, à época 2º Caderno, circularia apenas com a cobertura do carnaval, quer dizer, sem as colunas. A outra, já nos 90, teve a ver comigo. Era sexta-feira e eu tinha que fechar três colunas do Lúcio Brasileiro, que estava viajando, e duas minhas. Cedinho da manhã, eu havia me submetido a um incômodo exame de endoscopia que me deixou nauseado o dia inteiro. Concluí as três colunas do Lúcio e a minha de sábado. Quando ia começar a de domingo, a fraqueza bateu e eu desmaiei, somente acordando às quatro da manhã, totalmente atordoado. Mesmo sem culpa, demorei a me perdoar...

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Os bares da (minha) vida


Bem no comecinho era o Escorrega lá vai um, na Praia do Náutico, vizinho à vila de pescadores, onde se sorvia uma deliciosa caipirinha de maracujá. Bem mais à frente teve o Le Snak, de nome pouco criativo mas com ótima freqüência madrugada adentro, bebida honesta, tira-gostos e sanduiches saborosos. Já nos anos 90 fiz do Coração Materno minha casa noturna. O dono era uma grande figura, Nonato Freire, que mais tarde seria secretário de Cultura de sua terra, a Bahia. Certa vez, fui ao Coração Materno e bati a cara na porta, como se diz. Na ida seguinte disse ao Nonato: ´É pior ser traído pelo bar do que pela mulher que se ama. Porque sendo traído pela mulher, a pessoa vai ao bar. E sendo traído pelo bar, vai pra onde´? Nonato deu uma sonora gargalhada.

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Logo no começo, a ´É...´ só trazia charge nas edições de sábado, domingo e segunda. Depois passou para a semana inteira. O primeiro chargista das minhas colunas foi o Maurício Silva, que revezou com muitos outros. Teve o Éris, de fino traço, o premiado Newton Silva, linhas fortes e marcantes. O Glauco também freqüentou e por vezes fizemos parceria. Wagner Rocha, do ´Jornal da Praia´ e que depois colaborou nas tirinhas do ´Pixote´, criador do divertido personagem Brasilzim. Thyago, hoje nas tiras do ´Zoeira´, começou comigo e até ganhou prêmio nacional. Klévisson, maravilhoso, também andou por lá. Aos citados e a um ou outro que eu possa ter omitido, credito boa parte do público conquistado.



Na imagem, Newton Silva e suas famosas baratinhas.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

A charge é tão importante para mim que uma vez a ´É...´ saiu sem e lá no final eu escrevi: ´A coluna de hoje foi produzida originariamente em preto e branco´.



Charge do Maurício Silva, sempre presente na coluna É.

Quem me marcou muito no início da carreira foi o jornalista Ezaclir Agarão, que conseguiu convencer o empresário Edson Queiroz a embarcar em uma aventura cinematográfica, produzindo ´O Homem de Papel´, todo rodado em Fortaleza, com Vera Gimenez (mãe da apresentadora Luciana Gimenez), Jece Valadão, José Legoy e o próprio Ezaclir, que dirigiu. Se a memória não me trai, aparecia também o radialista Narcélio Limaverde apresetando um telejornal. Ezaclir editava o caderno FS (Fim de Semana), no jornal O Povo. E eu, à procura de um lugar ao sol. Chamou-me à sua sala e me pediu para elaborar uma página. Fiz um esboço a mostrei a ele que foi logo dizendo: ´Você acaba de me provar que tem sensibilidade jornalística´. Não cheguei a trabalhar com Ezaclir, porque preferi seguir com o meu irmão. Mas dele guardo ótimas lembranças.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007



Muitos me abordam perguntando se já me senti tentado a disputar mandato eletivo. Não me senti, não me sinto e jamais me sentirei. Primeiro, por falta de vocação, embora tenha minhas dúvidas se conseguiria ser tão inútil quanto tantos outros que existem por aí. Depois, total ausência de apetite para a atividade. E posso alardear na plenitude a minha recusa, porque já me foi oferecida candidatura à Assembléia Legislativa, com reais chances de vitória. Deixa estar, vou ficando por aqui, que aqui é o meu lugar.

Meu irmão Lúcio Brasileiro marcou muito a minha carreira, não apenas por me ter lançado na profissão (fato já relatado nesses ´30´) mas também pela convivência recheada de fascinantes conversações. Lúcio consegue ser ao mesmo tempo emotivo e pragmático. Certa vez, em nosso (dele) escritório, me comunicou que havia feito um tipo de seguro e me colocado como beneficiário. Como não gosto desse tipo de assunto, perguntei, preocupado: ´Irmão, você está falando dessas coisas que a gente recebe quando o outro morre´? E ele, levando completamente para o outro lado: ´É, meu irmão, mas pode ser amanhã´...

quinta-feira, 22 de novembro de 2007


Era o começo do fim da ditadura, com muitas resistências ainda. Eu trabalhava na Câmara dos Deputados e escrevia coluna semanal. Aos gabinetes dos deputados começaram a chegar envelopes contendo fotos de dom Ivo Lorscheider, primo de dom Aloísio, aos beijos com uma mulher em uma sala de cinema. Montagem grosseira para comprometer os religiosos que haviam feito a opção pelos pobres. Ao ver as fotos, dom Aloísio comentou: ´Se fosse eu, ainda se poderia aceitar. Afinal, sou bonitão e cheio de vida. Mas o Ivo, sem condição´. Certa vez, estava com familiar doente em estado delicado na Casa de Saúde São Raimundo. Dom Aloísio foi ao quarto e orou. Fiquei emocionado e o meu familiar, curado.

De música e amigos


Era um domingo ensolarado. Telefonei ao Nonato Luiz e o convidei para irmos passar o dia na casa do pianista Ricardo Bezerra (e Bete), na Maraponga, para onde também se deslocaria a cantora Amelinha. Peguei Nonato (com o violão), comprei algumas cordas de caranguejo e fomos. Quem apareceu por lá foi o cantor-compositor Alceu Valença, que tinha feito duas apresentações no José de Alencar. Nonato, feliz por ter sido apresentado a Ricardo e Amelinha, tocou, emocionado, para Alceu, a quem pediu uma ´canja´. O renomado cantor pernambucano, visivelmente em fase de astral não muito alto, se recusou, deixando o clima bem ruinzinho.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

30 anos

A profissão me ensejou grandes amizades. Uma delas seguramente é Ruy Lima, que conheci no começo do Diário do Nordeste, eu nesta coluna e ele na editoria Nacional e Internacional. Ruy galgou os mais altos escalões do jornalismo de TV, chegando a ser um dos quatro editores de rede do Jornal Nacional, no auge. Cobriu Copa de Futebol, Olímpiada, redemocratização (e eleições) na Argentina, Chile e Uruguai, esteve em Cuba no restabelecimento das relações do Brasil com aquele País. Implantou aqui a TV Jangadeiro e a TV Manchete, onde logo virou repórter nacional. Ruy está de volta ao Ceará, terra que adotou, mais um desafio na TV O Povo.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Famosos em casa II


A múltipla e sensacional artista Bibi Ferreira, quando veio encernar ´Piaf´, fazia suas refeições no Casa Nostra. Uma noite fui até a mesa para cumprimentá-la e fiquei emocionado com tamanha simplicidade e com o brilho no olhar. Mais tarde, indaguei do garçom Bernardo o que ela tinha jantado e logo passei a informação para a coluna do Lúcio Brasileiro (eu era assessor do restaurante, como já disse em edições passadas). Dois dias depois, Bibi chamou o Bernardo e disse: ´Você, hein, contou para o Lúcio o que eu comi´...

Famosos em casa


Era início da noite de uma quarta-feira quando o telefone do Casa Nostra toca. Atendo e constato que do outro lado estava nada menos que Pelé, querendo uma mesa de quatro lugares. Anotei a reserva, mas, precisando me ausentar, não pude esperá-lo. Prejuízo meu. No outro dia soube pelos funcionários que o rei, acompanhado da cearense Flávia Cavalcante, então Miss Brasil, e de familiares dela, havia dado um show de simpatia, inclusive se deixando fotografar com todos. O mais feliz era o chef Mestre Antônio, formidável criatura, que ainda hoje guarda a lembrança, fazendo questão de mostrar a todos que o visitam.

Casa Nostra


Tarcizo Azevedo me indicou a Raimundinho Feitosa, na época inaugurando um ótimo restaurante italiano, o Casa Nostra. Fui conversar apenas por educação, já que não me empolgava ser assessor de Imprensa nem relações públicas, embora se tratem de profissões dignas como qualquer outra. Entanto, me encantei de saída com o Raimundinho e com a casa, sem falar no pessoal, distinto e atencioso. Por isso aceitei. E, cá pra nós, modéstia de lado, sou um ótimo assessor. Jamais mandei a mesma informação para mais de um jornalista. Se aparecia lá uma autoridade da política, eu conversava, tirava informações e distribuía. Do empresariado, idem. A discussão para o meu reajuste salarial se dava em uma mesa externa, no chamado Salão Sanhaçu. Durante rodadas de chope, Raimundinho escrevia em um papel quanto pretendia pagar e eu escrevia em outro papel quanto achava que merecia receber. E sempre bateu.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007


Quando Deus achar por bem me levar desta para uma igual ou provavelmente melhor, recomendo aos que gostam de mim que não lamentem, e aos que desgostam, que não comemorem. É que de uma forma ou de outra eu estarei muito feliz, como sou agora.

De ídolo a herói


Depois de Gildo (Fernandes de Oliveira), meu maior ídolo em futebol foi Reinaldo, do Atlético Mineiro e da Seleção Brasileira. Certa vez, em um sítio nas imediações de Messejana, Fagner ofereceu um churrasco aos jogadores que aqui vieram a seu convite para uma ilustrada ´pelada´ no Castelão. Lembro-me bem de Reinaldo, Éder e Sócrates. O sítio tinha uma pequena piscina, quase um tanque. Fui me refazer com o banho e aproveitei para nadar um pouco por baixo dágua. Calculei mal a distância e fui de testa no azulejo. Com o choque, desmaiei e afundei. Não havia chegado o meu dia. Reinaldo chegou no exato momento, nenhum segundo a mais, nenhum minuto a menos, me viu no fundo da piscina e rapidamente mergulhou, salvando a minha vida.

Na imagem: Sócrates, Reinaldo, Mino, eu e Fagnólia

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

De música e amigos, dois tempos.


1 - Em 1987, o correto homem público pernambucano Marcos Freire morria em acidente aéreo no Sul do Pará. Logo pensou-se em sabotagem, porque Freire estava determinado a fazer a reforma agrária que até hoje ´tartarugueia´. Veio a versão de que o acidente havia sido provocado por um passarinho. Nota que dei na ´É...´ : ´O poeta Fausto Nilo teve premonição ao escrever ´Lua do Leblon´, música de Lisieux Costa: ´Mas há um pássaro que vence um avião/ por quem Picasso explodiu seu coração´... Certa vez, segunda metade dos anos 90, consultei Fausto sobre a possibilidade de ele colocar letra em uma melodia minha. Eis a resposta: ´Você é meu amigo, mas vai ter que entrar na fila como todo mundo´. Fausto foi justo, mas como tenho total aversão a fila, embora faça questão de respeitá-la, a música acabou sendo gravada em CD instrumental, outra história.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

30 Anos


Certa vez estava com as mãos na cabeça: prazo final para entregar a declaração do Imposto de Renda e eu, incapaz de elaborá-la (todos são, afora, claro, os especialistas), cheio de trabalho e ainda com duas meninas pequenas precisando de minha orientação nas tarefas escolares, tive uma idéia luminosa: telefonar para o meu amigo Edilton Urano, craque na matéria. Pelo telefone mesmo fui passando as informações e o Edilton vinha de lá com os dados necessários ao preenchimento. Desconheço caso igual.

30 Anos


Primeira metade da década de 80. Havia um deputado estadual e coronel chamado Orzete Philomeno Gomes. Na época se discutia o restabelecimento das eleições diretas para presidente. Na página de Política do ´Diário´, saiu uma declaração de Orzete: ´Sou contra eleições diretas porque o povo não sabe votar´. Na Coluna É..., que ainda não era assinada, eu escrevi: ´É incrível, mas o deputado admite que o povo que o elegeu não sabe votar. E não deve saber mesmo´. No mesmo dia, o repórter da Editoria de Política Paulo Ernesto Serpa foi à Assembléia. O coronel Orzete o chamou à sala, pediu para a secretária sair, fechou a porta e perguntou quem havia escrito a nota, para fazer a pessoa engolir o jornal, enquanto amassava o exemplar em tom altamente ameaçador. Paulo Ernesto, formidável criatura, nada disse. Entanto, eu telefonei para o gabinete de Orzete e deixei o recado com a secretária: ´Diga ao deputado que a nota foi escrita por mim, Neno Cavalcante. E que eu estou todos os dias aqui na redação do ´Diário do Nordeste´´.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

De autor a personagem


Foi a publicitária Ângela Borges que me ensejou uma das amizades mais fascinantes, José Simão, o articulista do riso da ´Folha de S. Paulo´. No particular, o ´Macaco´ que faz o Brasil inteiro rir com suas tiradas geniais, é uma criatura indignada com as desigualdades e as injustiças sociais. Na semana passada, publiquei uma das duas referências que ele me fez. Agora, a outra: ´Como diz o Neno Cavalcante lá do Ceará, NÃO ME PERGUNTEM ONDE VOU PASSAR O CARNAVAL´! Os leitores entupiram o e-mail do Simão com essa pergunta. Grande curtição.

Por vezes vi jornalista metido a auto-suficiente dizer que não precisa da Revisão. Talvez seja o que mais necessite. Fazer pouco caso da Revisão e até cometer injustiça com esses dedicados profissionais é até hoje prática de alguns desavisados. Estou noutra. Minha relação com os revisores sempre foi de respeito e camaradagem. E acima de tudo humildade quando corrigido. Do comecinho lembro-me do Segundo (Francisco Gomes), mas convivi com muitos outros que passo a citar me penitenciando por eventual omissão: Francisco Garcia, Vânia Monte, Lucia Coelho, Socorro Cunha, Vessilo Monte (além de revisor, conselheiro intelectual), Macedo, Eduardo Solon, Chico Carvalho, Marcos Castelo, além da maravilhosa jornalista e professora Eleuda de Carvalho e o agora premiado escritor (biógrafo) Lira Neto. Minha coluna não passa mais pela Revisão. Talvez por isso eu tenha recentemente acentuado indevidamente a expressão ´aversão à fila', pelo que agora peço desculpas.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Mestre e Amigo


Dedé de Castro estava um dia na chefia de Reportagem (ele é editor de Pautas, o melhor pauteiro que conheci) quando de repente entra na redação um homem parrudo, cara de nenhum amigo, soltando fogo pelas ventas. Bradava que iria processar o jornal por o haver acusado de receptar carros roubados, segundo ele uma inverdade, pois não sabia que eram produto de roubo. Dedé, corpo franzino, mas com uma força interior de gigante, disse: ´Nenô, vou até lá ver o que aquele cabra quer´. Grosseiramente, o homem disse de sua ira. E Dedé fez-lhe uma pergunta: ´Qual a sua idade, cavalheiro´? - Trinta e cinco, respondeu. ´E quantos carros o senhor comprou, sem saber que eram roubados´? - Dezesseis. E Dedé fulminou: ´Engraçado, eu tenho 60 anos e nunca me foi oferecido um só carro roubado. No entanto, ao senhor, que tem apenas 35, ofereceram 16´... Murcho, o sujeito abaixou a cabeça e saiu pela mesma porta por onde jamais deveria ter entrado.