Nada mais do que seis quilômetros estabeleciam a distância entre a morada e a descoberta. O destino era o Farol do Mucuripe, onde atuavam as profissionais do sexo. No meu tempo de adolescente, não havia risco de assalto, de modo que dava pra percorrer o trajeto a pé. Mas preferíamos juntar quatro ou cinco companheiros e rachar o táxi, pois os ônibus não circulavam na noite um pouco mais tardia.
Nos namoros da minha adolescência a parte mais quente era o beijo na boca. Selinho, nem tinha esse nome, o mais comum. Mas quando o relacionamento rolava mais tempo ousava-se o toque entre línguas, bom que só. Não indo além disso, nem era necessário esconder das namoradas o destino que tomaríamos após às nove ou dez da noite. Elas aquiesciam, entendiam o nosso lado.
As mulheres da vida, com quem todos se iniciavam, eram maravilhosas. Pacientes, ensinavam direitinho os traquejos, os primeiros passos. Sabiam ouvir e também falar na hora certa. Tinha um amigo meu que desabafava as fossas e ouvia conselhos, alguns até sábios. Generosidade à flor da pele. Elas preferiam os da nossa faixa etária, mais jovens, porque os de 35 anos em diante vinham sempre com aquela conversa mole de tirá-las do metier, torná-las senhoras respeitáveis. Tudo da boca pra fora, promessas que se dissolviam com o passar do efeito etílico. Muitas delas tinham esse sonho, mas todas sabiam ser irrealizável. Pelo menos se dependesse daqueles mal relacionados no próprio lar. Uma gente que não sabe de nada, não tem o que ofertar a não ser papo furado.
As cortezãs (eita, fui buscar o termo no tempo do Brasil Império!) eram tementes a Deus. Não havia dinheiro que as levasse para o quarto na véspera de Natal, embora fossem quase todas arrimo de família (no dia 25, as casas nem abriam). Elas recebiam a clientela educadamente e no muito aceitavam convite para dançar e jantar. Na Sexta-feira Santa, coisa alguma, nem conversa. Porém, após à meia-noite mais um minuto (saudade da boate da Glorinha, no Crato, que jamais frequentei), aí sim, o mundo voltava à condição de mundano.
Naquele tempo o vírus HIV ainda não havia sido “criado”. No máximo, se pegava o velho “esquentamento”, identificado facilmente após a ingestão de um copo do caldo-de-cana, reimoso e denunciativo desse e de outros males sexualmente transmissíveis, todos sem maiores consequências.
De algumas lembranças que guardo, posso garantir que aquelas mulheres de vida nada fácil nos ensinaram mais do que a profissão delas poderia sugerir. Parece que é daquele contato que o futuro adulto começa a se fazer gente.